quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Estamos cercados de corrupção


Conceitualmente, a corrupção pode ser entendida como atentado ou transgressão às normas, princípios e valores, tantos os jurídicos quanto os sociais. A corrupção distorce a ética que deve reger uma sociedade, configurando-se sempre em uma lesão.

Segundo Pesquisa Datafolha realizada em agosto de 2009, que busca retratar a ética no Brasil, para 43% dos entrevistados, o termo se refere a um conjunto de práticas fixadas na esfera pública (governo e poder público). Para 21% está associada a comportamentos individuais de falta de ética, tais como, levar vantagens, traição, deslealdade. Associam o conceito a roubar bens/ dinheiro 19%, a atos ilícitos 4%, a crimes fiscais, relacionados a impostos 3%, a extorsão e suborno para a aquisição de valores pessoais 2%.

Em relação à percepção de corrupção em instituições brasileiras, 92% dos entrevistados elegeram os poderes Executivos e Legislativos, no âmbito federal e estadual, e os partidos políticos. Já 15% acreditam que não há corrupção no Poder Judiciário. Quanto maior a escolaridade e a renda familiar maior a desconfiança institucional e maior a admissibilidade de ter cometido infrações. Os menos educados e mais pobres demonstram maior rigorismo moral em todos os quesitos, no entanto, é uma variação que não agride a sensação de certa homogeneidade.

Observando os números da pesquisa, Renato Lessa, professor de teoria e filosofia política no Iuperj e na Universidade Federal Fluminense, fez a seguinte análise “ 74% concordam com a ideia de obediência à lei como algo superior ao interesse privado (adeptos de um imperativo categórico moral). Já apenas 56% concordam com o diagnóstico de que as pessoas estão dispostas a ‘tirar vantagens’ umas das outras (ou toma-las como meios, e não como fins).”

Schwantes, reconhecendo a fragilidade do caráter humano; sua tendência nata à deformação, atribui à crise moral o sintoma da ausência generalizada de caráter. E afirma: “São parasitos os que exploram a sociedade para benefício próprio, os que vivem à custa do Estado sem nada produzir, os que vegetam em lastimosa ociosidade. Tais indivíduos são como células cancerosas que roubam a vitalidade do organismo social.”

Tendo em vista a pesquisa, pode-se deduzir que não somos animais socráticos, para os quais o conhecimento do bem conduz necessariamente o seu cumprimento, senão vejamos: 83% admitiram ao menos uma prática ilegítima leve, média ou pesada, por exemplo, colas em prova ou concursos, receber troco a mais e não devolver, comprar produtos piratas, furar sinal de trânsito, dentre outras do mesmo nível ou mais graves.

Entre os entrevistados, 94% dizem ser errado oferecer propina e ser repreensível vender o voto, no entanto, 79% acreditam que eleitores vendem seus votos. Ressalte-se que apenas 13% admitem já ter trocado o voto por dinheiro, emprego ou presente e 33% concordam com a ideia que não se faz política sem corrupção.

Rui Barbosa ilustra bem a questão da corrupção política, primeiramente, aponta a política como: “ciência cujo único dogma inalterável é o dos princípios furta-cores, com um matiz para os nossos amigos e outro, oposto, para aqueles que não o são”. E nos fala do homem corrupto, como aquele que põe em senzala sua dignidade e caráter, todavia, ao mesmo passo, o descreve como um ser servil e confinado, longe da luz, do vento e oxigênio que tudo limpam e regeneram. Por fim, caracteriza a corruptibilidade como um círculo vicioso, de fluxo incessante. “Cada um dos que vão chegando, se aduba dos outros; com eles se cruza e recruza novas espécies lhe surgem do coito sutil; há hibridação em hibridação, de multiplicação em multiplicação, um mundo incalculável de malignidades se enxameia [...] os antigos colaboram com os recentes; do ajuntamento de uns e outros se vem gerando novos, pelo concurso destes com aqueles, crescem ao infinito, em número, em diversidade, em virulência aos contágios, as infecções, as pestes”.

Partindo do ano 410 da Era Cristã, encontramos na narrativa do teólogo e filósofo Santo Agostinho, a expressão: "Dentro de cada homem há uma guerra civil". Assim, pontua a necessidade de que o homem socializado possua um temor reverencial, o que por ele foi denominado como: “virtude civil”, um sentimento humano voltado a Deus, o que leva o homem à não “decair” e a afastar-se dos três maiores pecados (fraqueza do caráter humano): ânsia por dinheiro e bens materiais; desejo de poder e o desejo sexual.

Embora tenha vivido em época diversa de Santo Agostinho, Kant compara a ambição, o desejo de Poder e a inveja aos três maiores flagelos da humanidade, quais sejam, a guerra, a fome e a peste, em “Idea for a General History”.

Para Rousseau, o homem nasce bom e sem vícios, porém, a sociedade civilizada o corrompe. Thomas Hobbes, em “Leviatã”, nos sugere uma idéia antagônica, descreve um ser humano que, por natureza, é mau, sendo controlado (freado em suas paixões e vícios) por meio do medo institucionalizado, imposto pela sociedade em que está inserido.

Para, Lúcia Santaella houve para a humanidade um instante histórico e preciso, em que o homem deixou de ser simplesmente um primata e tornou-se o “Homo Sapiens”.

Edgar Morin, nos leva a aportar em uma tensa realidade, a de que a “igualdade” social, está repleta de desigualdades, umas são de fato, outras de direito, porém, ambas geram intolerâncias, antipatias, brigas, disputas. Morin sugere que das desigualdades e distinções nasce o poder político, que é a existência de uma dominação pré-constituída, que posteriormente, viria ser o Estado. Assim traçamos um paralelo com o Estado Moderno, de forma que, tal e qual foi no período da “hominização”, a vida social requer organização e cooperação de todos, contudo, o modelo coletivista onde tudo é bem de todos, possui um sistema de repartição de riquezas “mais ou menos” igualitários, com vantagem, sem dúvida, em favor do chefe.

Isto pode ser claramente demonstrado. No Brasil, por exemplo, perseguem-se mais os pequenos contraventores, como os vendedores de DVD pirata, do que os grandes corruptores de fato, como empreiteiros, que se beneficiam de um sistema de proteção. A soma anual dos negócios das empreiteiras de obras públicas dá um montante oceânico que nunca se viu levantado. Mas não dá manchetes e TV em campanha contra os sistemáticos superfaturamentos, conchavos fraudadores de licitações, corrupção de servidores governamentais, contra os crimes de colarinho branco.

A corrupção dos pequenos, normalmente, tem a ver com elementos socioeconômicos, com o sentimento da difícil ou nenhuma perspectiva de melhora, com a formação pessoal precária, entre outros estímulos. Já a corrupção graúda é uma categoria especial, obra de ganância que não se satisfaz nunca, é a imoralidade pura.

Por fim, resta dizer que, necessariamente, a corrupção é um processo dicotômico: intrínseco e extrínseco, pois, inicia-se no caráter e se exterioriza na sociedade, tornando-se uma patologia cultural.

No poder ou não, o homem pratica atos corruptos em prol de interesses particulares, a título de ilustração: a venda de votos, contribuindo para o ciclo vicioso da corrupção. Só uma sociedade consciente de seus direitos de cidadania, ciente de seu poder político e com aprimorado poder de escolha, conseguirá dar passos no sentido da evolução.

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Um terrorista sequestra 20 pessoas em um shopping e as esconde dentro de uma sala. Nesta sala os reféns encontram-se amarrados à explosivos de grande capacidade destrutiva. Os agentes policiais recebendo o chamado prontamente se dirigem ao shopping. Ao chegar ao local estabelecem contato com o terrorista, que demanda várias exigências a serem cumpridas para a liberação dos reféns vivos, entretanto em nenhum momento conseguem ver quem está ao telefone. O comandante da operação dada a situação de grande perigo decide ordenar a invasão e acaba por prender um rapaz com as mesmas características que foram apresentadas na ligação anônima denunciando o delito, entretanto não encontram os reféns. Posteriormente a captura, começam então os policiais a perguntar ao rapaz aonde estavam os reféns. Nenhuma resposta é encontrada, uma vez que o rapaz recusava a dar as informações, sob a alegação de que não era o terrorista e portanto não sabia a localização do cativeiro. O comandante diante das alegações do jovem tenta estabelecer contato com o telefone, o qual antes o terrorista vinha utilizando, mas a ligação não é atendida. Tendo em vista o prazo estabelecido pelo terrorista, a situação começa a se agravar diante da iminente explosão caso não sejam encontrados os reféns. O Comandante nesse momento se depara com um dilema moral, filosófico e legal:

Deve torturar o rapaz em busca das informações abandonando assim o respeito à dignidade humana, sobrepondo o comunitarismo em face do liberalismo, ou até mesmo praticando um ato ilegal, que resultará na salvação de muitas outras vidas? O que você faria?

Em que momento um ser humano realizou o ato mais cruel?

Qual é o pior dos sete pecados capitais?

Qual sua opinião a respeito da legalização do uso de drogas?