Quando crianças acreditávamos que os contos de fadas que assistíamos eram inocentes. Branca de Neve e Cinderela, por exemplo: elas têm o seu final feliz, casam-se com os príncipes de suas vidas. O que nos esquecemos de analisar é o percurso que as leva à ele. As respectivas madrastas tomadas pelo sentimento da inveja fazem de tudo para que tal felicidade não aconteça. E então? Serão esses contos apenas filmes infantis?
A inveja, segundo João Carlos Lino Gomes, é a tristeza diante da liberdade que o outro tem de ser feliz e de, nesse movimento mostrar a possibilidade de sua felicidade fracassada. Esse pecado só tem a possibilidade de realização no outro, porque em si mesmo não se completa, já que seu objeto não é individual. Segundo Aristóteles: “o homem é um ser político”; e como tal não vive apartado da sociedade, pois constitui sua essência o agrupamento.
Mas o indivíduo moderno entende o mundo como um espaço para desenvolver seus projetos de vida particulares. Estamos na era do individualismo, tentamos mitigar a natureza política intrínseca à nós, perde-se a noção do coletivo. Ainda segundo o filósofo clássico, o bem é o fim para o qual cada ação é praticada, e o bem maior da vida humana é a eudaimonia, traduzida por muitos como felicidade. Se a nossa felicidade depende da finalidade de nossa vida nunca poderemos alcançá-la através da inveja. O coletivo só é percebido quando no comparativo.
Nosso individualismo irracional faz com que ao mesmo tempo em que não precisamos dos outros, precisamos ser melhores que eles, ter as melhores coisas e nos sentimos melhores ao sermos invejados, pois se alguém nos inveja isso significa dizer que somos bons. Certo? Errado. Significa dizer que nunca seremos bons, se o bem for levado em consideração ao pensamento filosófico clássico. Também para Platão através da inveja não se atingiria o bem supremo, pois sua idéia de bem perpassa o justo, o correto. Faz-se necessário distinguir ser o melhor por motivos altruístas e ser o melhor por motivos egoístas (típicos da sociedade individualista calcada na inveja). O altruísmo pensa no bem comum, para todos, enquanto o egoísta só visa a si, e segundo Santo Agostinho este nunca prosperará.
Se a sociedade egoísta é impossibilitada de prosperar, assim também o é a inveja, parte característica dessa. Voltando aos clássicos, Aristóteles nos ensina à perseguir nossa essência, nossa finalidade para que possamos atingir o bem, importante dizer: NOSSA própria finalidade individual ou coletiva, mas nunca a do outro, uma finalidade que não nos pertence.
Voltando à nossa infância, pode-se quase que concluir que as madrastas (o mal) não consegue dominar sobre o bem (príncipes, princesas, heróis e heroínas) porque perseguem, por inveja uma finalidade que não lhes pertence.
Mas e a Ira? Seria ela tão aristotélica?
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